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Moradores da Maré dança a canção 'Waka Waka', de Shakira. Foto: Reprodução

A rapidez do Brasil

Cacá Diegues - Jornal O Globo - 28 Janeiro de 2023

Nossa esperança no país continuará viva e febril, não importa o que ele tiver a nos oferecer em nome dela


Acho que, ao contrário do que a gente pensa e diz, tudo no Brasil acontece numa velocidade que, para o bem ou para o mal, não tem semelhança no resto do mundo. Ninguém sabia direito quem era Jair Bolsonaro e ele foi eleito presidente do país. O que quase acontecia de novo agora, quando tentou se reeleger e foi derrotado por Lula que, por sua vez, poucos meses antes se encontrava na prisão para onde fora enviado pela Lava-Jato, que havíamos elogiado tanto durante sua curta existência.

Bolsonaro, Lula e a Lava-Jato, como os percebemos, pertencem a um Brasil que praticamente não existe mais. Cada um deles se encontra marcado pela atuação em um mundo político que poderia ser datado do período de Plínio Salgado, Getúlio Vargas ou Carlos Lacerda. Cada um deles pode ser condenado ou exaltado pelo que aqueles seus semelhantes fizeram ou não no passado ainda recente do país.

Claro que podemos preferir um deles, conforme desejemos para o Brasil um destino assim ou assado. Claro que cada um deles representa uma perspectiva diferente para a vida por aqui, e temos todo o direito de termos uma preferência por aquele que julguemos capaz de nos prover tal vida. Só não temos o direito é de pensar que aqueles que pensam diferente de nós sejam definitivamente os bandidos nessa história. Ou os mocinhos, tanto faz.

Claro também que, de minha parte, vou sempre pensar no que ainda não tiver experimentado como preferencial na próxima experiência política que o país experimentar. Claro que vou sempre achar que alguém como Lula me dará muito mais esperança no país do que o recente fracasso de Bolsonaro e seu triste movimento de porrada em quem não pensa como ele. Não quero pensar como ninguém, estou satisfeito em pensar o que penso, com quem quer que seja que esteja pensando desse jeito. Trocando em miúdos, quero ser livre para projetar para o Brasil uma economia e um comportamento social que julgue mais conveniente, segundo o que sei e o que andei lendo e ouvindo, em benefício de saber mais sobre nós mesmos.

Quem sabe, aí saberei mesmo o que penso saber.

Por enquanto sou e é como tivesse sido sempre Lula, para que os pobres melhorem de vida, que se alimentem com as tais três refeições por dia (será suficiente?) e que vivam em paz com suas famílias, tão queridas e protegidas quanto as nossas. Quero viver num país em que não tenha vergonha, nem medo de cruzar na rua com nenhum outro tipo de gente cuja diferença para nós a torne uma inimiga. Mesmo que apenas potencial.

Ainda por enquanto, sou e é como tivesse sido sempre um batalhador dessa libertação de todos, sem ter que estar explicando o que Fulano e Beltrano ou os seguidores de Ciclano quiseram dizer com o apoio a tal lei ou a tal político, capaz de agir em benefício dos que precisam, desse ou daquele grupo social que merece a libertação desse horror da dependência dos outros.

Como os velhos políticos, Bolsonaro teve sua oportunidade e nos revelou apenas uma fome total do que não é seu, um desejo enorme de possuir presentes e joias que, garanto, nunca saberemos se pertenciam mesmo a ele e por que razão. Nossa esperança no país continuará viva e febril, não importa o que ele tiver a nos oferecer em nome dela.